sábado, 14 de março de 2009

Monte da Paradaia (Romãs, Sátão)

Pede-me um leitor deste blogue para estudar a possível origem do topónimo Paradaia, que identifica um monte na freguesia de Romãs, concelho de Sátão. O topónimo em questão é ignorado pelos nossos documentos oficiais que, para o mesmo acidente geográfico, registam os nomes de Monte do Barrocal ou Monte de Nossa Senhora do Barrocal. Acrescenta o nosso consulente que, neste lugar, estão referenciados «uma necrópole, um castro e uma igreja moçárabe».

Uma rápida pesquisa permitiu-me acrescentar algo mais a estas informações, como seja o facto de ali se realizar, no dia 2 de Fevereiro de cada ano, a romaria de Nossa Senhora do Barrocal, em honra de Nossa Senhora das Candeias, orago da capela ali existente, a que o povo chama Capela das Candeias ou da Fevereirinha.

Esta romaria corresponderá, quase pela certa, considerando as particularidades do lugar e os respectivos achados, à cristianização do festival celta do primeiro dia de Fevereiro, conhecido por Imbolc "Purificação" ou Dia da Senhora, que honrava a deusa Brigitt, «filha do deus Dagda, a deusa tripla dos cabelos de ouro. Era a mãe, a filha e a esposa dos deuses das origens e dos primeiros druidas. Personificava a poesia, a saúde, a força, a adivinhação, a inteligência e protegia o lar». O processo da cristianização, perante a dificuldade em erradicar as múltiplas manifestações da religião e dos costumes pagãos, transformou esta deusa Brígida em Santa Brígida, arvoradando-a em padroeira da Irlanda, com culto generalizado nesse mesmo dia 1 de Fevereiro.

A ocupação romana trouxe consigo um pouco de todo o império, incluindo, como não podia deixar de ser, a sua religião, abrindo caminho a novos sincretismos.

Neste mesmo mês de Fevereiro, entre os dias 13 e 21, a velha Roma promovia um dos seus maiores festivais religiosos, que pretendia honrar os mortos e aproximar os membros da família, envolvidos na visita aos túmulos dos seus familiares, onde levavam flores e oferendas de sal e de pão embebido em vinho.

Considerando as características do Monte da Paradaia e a existência ali de uma necrópole, pensamos ter encontrado a resposta para a origem deste topónimo no festival religioso a que acabámos de aludir. A legitimação desta hipótese, que até o nome da freguesia parece confirmar, deixamo-la a cargo de quem melhor a pode fazer: a Arqueologia.

Parentalia, era o nome deste festival, e daqui podia derivar o nome Paradaia, mediante fenómenos fonéticos presentes na formação da língua portuguesa:

Parentalia >

> *parantalia (assimilação da segunda sílaba por influência das envolventes);

> *paratalia (assimilação progressiva da segunda sílaba por desnasalação);

> *paradalia (por sonorização do intervocálico -t- > -d-);

> Paradaia (por síncope do -l- intervocálico).

2 comentários:

Anónimo disse...

Há um outro monte na Galiza, na comarca do Morraço, no concelho de Moanha, chamado Paralaia. Imagino-o emparentado com este outro. Ou quiçá possa vir de pedra e laje?

Paulo disse...

Mário Sacramento faleceu há 40 anos. Foi, desde a juventude, um combatente pelas causas mais nobres que o Homem pode ter.
A justa homenagem a Mário Sacramento, quiçá a que tarda, é o seu reconhecimento como pensador e militante antiprovinciano. Foi este, seguramente, o combate essencial de toda a sua vida.
Ancorado num antidogmatismo e numa disponibilidade total à aprendizagem, elegeu os jovens como seus interlocutores (" a adolescência, a juventude, são isso mesmo: o refazer intuitivo da experiência milenar do homem"), arrostou com incompreeensões e dificuldades, muitas vezes vindas de onde menos esperaria, mas permaneceu sempre livre.
Foi um paciente artesão da prática de abertura ao outro, da análise científica da realidade e da vida, da tolerância e do respeito, num tempo e num meio em que todas as regras eram contrárias a tal atitude.
Há quem insista em dar-lhe uma dimensão paroquial e restrita - nada mais injusto. Ainda em vida, contestou sempre com veemência os que lhe "insinuavam" a limitação que era viver no microcosmo aveirense.
O que o tempo se encarregará de mostrar é que Mário Sacramento fez da vida uma recusa constante desse estatuto, preferindo sempre ser visto como um cidadão do mundo, inquieto, irreverente e livre.

Publicado em 27 de Março de 2009